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Foto do escritorGilsom Castro Maia

Existem caminhos para entrar no mercado da Psicologia do Esporte? Entendendo o ambiente esportivo II

Atualizado: 22 de jun. de 2020

Nos vários textos publicados nesta coluna  sobre psicologia do Esporte, o intuito foi, e é, apresentar ao leitor as várias possibilidades de atuação da área, assim como sua história, desenvolvimento científico e aplicado. A história da Psicologia do Esporte, assim como a própria história da Análise do Comportamento também no contexto esportivo  é atrelada ao desenvolvimento cultural esportivo e às demandas que foram surgindo a partir deste desenvolvimento.

No primeiro texto desta série sobre o mercado da Psicologia do Esporte  foram apresentados ao leitor caminhos que podem ser tomados como ponto de partida para aqueles que se interessam pela área.

Com o crescimento esportivo enquanto sucesso de público, mídia e investimento monetário, além da presença de marcas e grandes corporações ditando o ritmo e rumo deste fenômeno, algo anteriormente presente somente no mundo corporativo também passou a vigorar no ambiente esportivo e exige habilidades fundamentais para aqueles que desejam trabalhar no ambiente esportivo, habilidades de lidar com marketing, sistematização de serviços prestados anteriormente, o impacto destes serviços e, principalmente, como isso é apresentado para aqueles  que de fato serão os consumidores deste trabalho.  Então, quando nos referimos ao termo “Marketing”, estamos nos referindo ao que exatamente?


No livro “Consultoria em psicologia do esporte: orientações práticas em análise do comportamento” de 2002, o autor Garry Martin procura trazer ao estudante ou profissional da área as noções que envolvem o marketing.

Para Martin (2002) e Kotler (1984) o termo marketing engloba, também, o contato inicial entre cliente e prestador de serviço, assim como as características do profissional, que são tipicamente associadas à qualidade destes serviços. Ainda, segundo Martin, essas características envolvem os seguintes aspectos.

Escritório, Equipamentos e Pessoal

Martin (2002) ressalta que a conduta de um profissional é demonstrada também pelo modo como seu ambiente e ferramentas de trabalho são visíveis ao cliente. Então, além de um escritório que combine com o serviço que é oferecido, quais são os tipos de equipamentos que o profissional irá precisar? E, se pensarmos em adequar o acesso aos serviços ou ferramentas de trabalho à era digital, como obter programas de cobrança e listas de avaliação comportamental para serem usados por meio de dispositivos de mídia? – Tablets, smartphones e computador. Como o cliente poderá entrar em contato? Pode-se criar um e-mail de servidor próprio com o nome da empresa ou ter alguém no escritório para atendimento ao cliente em horários que o profissional estiver atendendo? Para administrar essas questões também é necessário ter noção de quais habilidades de administração de negócios o profissional já tem e se é necessário suporte de instituições que guiam novos negócios, além de profissionais de mídia, divulgação e artes gráficas.

Fazendo Contatos

Demonstrar organização, objetivos e prazos de forma clara é outro componente que demonstra credibilidade frente ao futuro consumidor de seus serviços. No início da carreira ou no momento de prospectar novos trabalhos o profissional deve estar disposto a fazer apresentações gratuitas para aqueles que têm potencial para se tornarem clientes. Nos contatos iniciais, questões como valores, seja para pacotes de treinamento ou consultas por hora, devem ser claros, assim como a negociação desses valores. Demonstra postura profissional e crença na qualidade daquilo que está oferecendo. Obviamente negociações de redução de valores para início de trabalhos são válidas, porém, os termos de renegociação devem ser claros e diretos.

Após ter clareza dos quesitos apontados acima, o profissional pode entrar em contato com diretores esportivos de instituições, e perguntar sobre a possibilidade de apresentar para treinadores e atletas as possibilidades da Psicologia do Esporte.

Como já citado no texto anterior, conhecimento sobre a modalidade esportiva da instituição ou time é fundamental, exemplos que demonstrem o potencial de trabalho a ser oferecido usando fatos e jargões da modalidade em questão faz com que o ouvinte tenha a real noção do quanto o profissional conhece sobre os possíveis benefícios de seus serviços.

Ainda, para Martin (2002) deve-se levar em consideração que o marketing sobre os serviços do profissional quase sempre é iniciado por outras pessoas, técnicos, diretores, consultores, outros profissionais das ciências do esporte e pais de atletas, organizar reuniões com estas pessoas pode render estabelecimento de bons negócios e rede de suporte entre profissionais.

Estabelecendo Credibilidade e Apoio durante Reuniões Iniciais

Conquistar respeito e confiança de potenciais clientes é algo que ocorre com o tempo. Reuniões iniciais servem para promover credibilidade e apoio de atletas e outros profissionais envolvidos com o esporte. Um fator importante para conquistar apoio é estar preparado e disposto para, de fato, se tornar parte do ambiente esportivo de um time ou organização esportiva (Martin, 2002).

Além de dominar a linguagem do esporte, e dos atletas com quem está trabalhando, o profissional deve se adaptar às agendas ocupadíssimas de atletas e técnicos, garantindo sua presença em treinos e outras atividades de um time. Esse espaço é importante para que o profissional consiga observar aspectos que possam não acontecer durante os treinos em si, mas, cujo seus desdobramentos sejam levados para dentro de quadra e etc.

Outro fator importante para ter respeito e crédito dos membros de uma determinada organização é a clareza dos direitos e deveres daqueles que estão submetidos àquele ambiente. Se os demais envolvidos não têm clareza sobre as possibilidades e limites de atuação do profissional pode haver desencontro de informações futuramente e com isso prejudicar o trabalho do Psicólogo do Esporte. Por exemplo, se um técnico, em uma conversa privada com pais ou agentes de um atleta, promete que o psicólogo pode resolver determinado problema – quando na verdade não pode, cria-se diversas expectativas que provavelmente irão atrapalhar o andamento dos trabalhos, ocultando outros problemas que poderiam ser facilmente solucionados caso os limites fossem claramente delimitados. Ao definir as possibilidades, e estabelecer boa comunicação com um técnico, aumentam-se as chances de que essa figura importante passe a apoiar suas sugestões e tratamentos perante a atletas e times.

Ainda, possibilidades e limites devem ser claramente abordados em sessões iniciais. Em um time pode haver grande variedade de experiências prévias com outros profissionais da Psicologia do Esporte e deve-se identificar e tratar individualmente essa gama de repertórios por meio de uma abordagem mais direta. Com isso pode-se diminuir as chances de intervenções individuais não efetivas, ou seja, caso um atleta tenha um bom repertório em técnicas e treino de habilidades psicológicas o profissional pode somente cuidar para o refino e manutenção destas habilidades, enquanto que com outros, pode-se realizar processos mais diretos, evitando falhas e deixando bem claro que cada técnica pode ser melhor aproveitada dependendo das habilidades deste atleta e que provavelmente no processo de identificação e estabelecimento destas técnicas algumas poderão não ser tão efetivas para alguns. Isso pode tornar o atleta mais receptivo à figura do Psicólogo assim como seus aconselhamentos, e, ao fazer com que um atleta seja receptivo – ainda mais se for uma figura importante, é provável que outros façam o mesmo.

Formalizando a Relação e Definindo seus Limites

Martin (2002) traz uma discussão importante sobre a formalização das relações de trabalho do Psicólogo do Esporte ao assinar contrato com um atleta ou equipe. Para o autor é importante que o profissional seja franco e sensível aos limites de sua atuação. O contexto em que se atua exige alguém treinado para intensificar desempenho ou para trabalhos voltados para a clínica do esporte? O autor traz essa discussão pois nos países da América do Norte a formação do psicólogo pode ser variada e o não cumprimento dos limites dessa formação pode acarretar em processos trabalhistas e etc. Uma pessoa formada em Psicologia do Esporte vai trabalhar com esse tema, se ela não é formada em Psicologia Clínica, por exemplo, ela não deve atuar na área.

NOTA: Aqui no Brasil o tema ainda é controverso, não há uma definição clara sobre limites de atuação de psicólogos clínicos e/ou do esporte no ambiente esportivo. As especialidades são reconhecidas pelo órgão que regula a profissão, porém, sem limites, diretrizes específicas ou fiscalização sobre quem está ou não atuando dentro de suas capacidades, especialidades e formação.

É sugerido por Martin (2002) que o Psicólogo do Esporte saiba reconhecer seus limites, e que ao identificar demandas clínicas num contexto de intensificação de desempenho, encaminhe o atleta ao profissional clínico.

Ainda se tratando de limites, caso o Psicólogo do Esporte vá atuar com modalidades esportivas que já tenha sido praticante, o profissional deve se lembrar que está fornecendo um serviço de psicologia do esporte e não um serviço de treinamento técnico. Vale salientar que habilidades técnicas e/ou táticas certamente são processos de aprendizagem que estão à mercê de um conjunto de variáveis que o psicólogo do esporte pode identificar e melhorar/reorganizar, a fim de criar melhor condições para estabelecimento de repertório. Então, no momento em que surgem os limites entre técnica/tática e treinamento de habilidades psicológicas, é mais proveitoso o contato direto com o técnico, sempre tomando cuidado para não invadir áreas cobertas pelas capacidades e deveres do técnico. Lembre-se: o técnico é uma das (ou a) figuras mais importantes e maior fonte de reforço de um atleta ou time, ele é seu principal aliado e parceiro de trabalho. Questões de conduta podem ser discutidas, mas sempre com cautela.

Por fim, no momento de formalizar a relação com um atleta ou time é importante que ambos os lados tenham clareza sobre: o objetivo do projeto, quais serviços serão fornecidos, quais serão as estratégias de tratamento, o que o psicólogo espera/precisa que o atleta faça, como os resultados serão monitorados, quem são as pessoas que terão acesso às informações coletadas, como serão os relatórios e devolutivas e como serão realizadas as cobranças e pagamentos dos honorários. Além dos locais e horários que serão os encontros com técnicos e atletas. E antes da implementação do programa o profissional deve se questionar sobre: Os objetivos do programa estão claros e o atleta concorda com a proposta? O tempo que passou com o atleta para a coleta inicial de dados foi o suficiente para conquistar sua confiança? As tarefas que serão exigidas – lições de casa e monitoramento de desempenho, são realistas? Caso o atleta deseje ter fácil acesso ao programa para consultá-lo onde estiver, como será feito?  Há a programação e possibilidades de gerar ganhos para o atleta logo no início do tratamento? Para Martin (2002) se a resposta para essas perguntas são sim, há grandes possibilidades de que o tratamento proposto seja efetivo.

Monitorando a Satisfação do Consumidor

O ambiente esportivo é dinâmico e mudanças ocorrem rapidamente. Para que o profissional possa se adequar de forma efetiva a tais mudanças, pode ser de grande valia formular e construir questionários para a avaliação de seu repertório profissional após o término de uma temporada ou finalização de intervenção. Além de ajudar a reconhecer quesitos a melhorar e potencialidades, obter tais informações pode ser útil na hora de renegociar um contrato ou permanência junto a uma organização ou time. Para Martin (2002), são essas avaliações que validam socialmente a importância de suas intervenções – e em se tratando de análise do comportamento, a validade social é o que garante ou não a continuidade de determinadas intervenções.

Por último, e não menos importante. O que este que vos escreve pode oferecer além do que já foi dito até aqui?

Os livros trazem informações importantes e valiosas para um profissional, a publicação guia deste texto é apontado por muitos como sendo um ponto de referência crucial para o analista do comportamento que deseja atuar no ambiente esportivo. Porém, determinados acontecimentos comuns na vida de um profissional não são relatadas rotineiramente ou, também, as transformações sociais que se relacionam à atuação podem ter acontecido de forma tão rápida que podem ainda não ter sido produto de pesquisa ou relato.

Em relação ao marketing e prospecção de locais de trabalho

Hoje as mídias digitais fazem parte da nossa vida e ignorar este fato pode significar um atraso profissional. Há diversas páginas profissionais voltadas para a divulgação da psicologia do esporte. Neste tempo de atuação, o que tenho percebido é que, mesmo que as imagens, textos e formas de divulgação de serviços sejam bem trabalhadas, o mercado sempre (ou quase sempre) prefere um profissional com um histórico consistente e claro na área. Incrementar currículo com informações tendenciosas pode se tornar um perigo. Se um profissional que mascara seu currículo é contratado por alguém que precisa urgentemente de um suporte e esse suporte não atinge as expectativas por conta da falta de habilidades deste profissional. Primeiro, pode haver ali uma falha de conduta ética e o que poderia trazer benefícios acabou causando malefícios que podem interferir na carreira de um atleta por um longo período. Segundo, se essa é a imagem que o atleta tem da Psicologia do Esporte, são poucas as chances de que ele vá recomendar os serviços da área para alguém. E com isso perdemos espaço para áreas que tem a intenção de trabalhar habilidades psicológicas, mas sem necessariamente ter a formação em psicologia.

Outro assunto que é sempre abordado em ambientes mais informais. O profissional que apresenta propostas para um local que já conta com Psicólogo do Esporte. Não há lei que impeça tal conduta, aliás, o mercado é livre. Mas, se pensarmos que o mercado e os círculos profissionais da Psicologia do Esporte são pequenos e os profissionais quase sempre se conhecem, como será visto quem adota tal prática? E se você for o profissional que já tem um espaço e algo deste tipo acontece, como você reagiria? A demanda vem crescendo e está se tornando comum a indicação de trabalhos entre os profissionais, quais seriam as chances de haver indicação de trabalhos para quem tem essa conduta? Esse assunto rende discussões longas e profundas sobre a atuação no mercado de Psicologia do Esporte e ter noção de quais são as regras não ditas deste jogo pode ajudar a entender melhor o que os livros não relatam. Trazer o assunto à tona não significa julgar a atitude em si, o ponto crítico da situação é o que a pessoa pode produzir para si neste ambiente em que deseja estar inserida.

O que exigir no ambiente de trabalho?

Quando estamos em início de carreira a tendência é aceitarmos qualquer proposta que esteja relacionada ao esporte. Resultados de trabalho não satisfatórios nem sempre indicam a qualidade de conhecimento teórico prático do profissional, podem estar relacionados ao que a instituição ou time fornece de suporte – financeiro, para elaboração de materiais ou atividades e políticas institucionais. Ou seja, não basta o profissional ser bem qualificado, a instituição tem que estar disposta a apoiar as solicitações do profissional para que o mesmo consiga desempenhar seu papel. Profissionais com maior experiência sempre discutem sobre essa necessidade e reconhecem que por vezes pode ser proveitoso recusar o trabalho diante determinadas propostas e condições impostas pelo contratante, que vão no sentido oposto do que é necessário para a implantação de um programa de treinamento psicológico.

Formação, estabelecimento de rede e criação de credibilidade entre pares

Os grandes eventos esportivos e as novas modalidades esportivas – como os e-Sports, têm mostrado cada vez mais a atuação do Psicólogo. Neste fato encontramos o grande marketing atual da área. Um bom curso de formação e especialização em Psicologia do Esporte cumpre todas as exigências do MEC para receber a certificação como centro de formação de especialistas, como por exemplo vasta carga horária, estágios obrigatórios e produção de trabalho final de curso. As oportunidades de formação ainda são escassas ou insuficientes e ainda restrita aos grandes centros. Cursos livres ou de extensão são válidos, mas não suficientes, é importante ter noção disso. Uma boa alternativa à falta de oportunidades de formação é a supervisão. Os livros oferecem o conhecimento teórico, a supervisão lhe traz como aplicar e lidar com problemas do dia a dia.

Antes de escolher um profissional para supervisão faça um levantamento de nomes e o que esses profissionais têm produzido, tanto no âmbito acadêmico – a rigorosidade da academia é o que válida também a formação científica do profissional, quanto em textos livres, mídia, e experiência profissional. Se as opiniões deste profissional lhe agradam, soam éticas e de conduta compatível com seus pontos de vista, não hesite e invista na sua formação.

Congressos e outros eventos sobre o tema também podem render bons frutos, a formação de rede e criação de credibilidade de um profissional começa aí. Não é incomum relatos de profissionais com anos de experiência sobre pessoas que as procuram pedindo estágios e/ou indicações. Embora a área esteja crescendo, ela ainda é volátil, as pessoas não lhe indicarão para estágios ou trabalhos se elas não o conhecem, afinal o nome de quem indica também está em jogo.

A credibilidade e possíveis indicações de trabalhos para aqueles que não tem experiência na área nasce então destes fatores: Formação e supervisão com pessoas com currículo de base sólida, além de bons cursos livres ou de especialização. O modo como o aspirante vem construindo seu currículo e o quanto está disposto a investir e trabalhar, e não somente surfar na onda da Psicologia do Esporte devido aos holofotes que tem se criado sob a área, também é levado em consideração.

Assim como em qualquer área, construir uma carreira sólida e ética na Psicologia da Esporte demanda tempo, dinheiro e noites de sono. Tenha como modelo bons profissionais, invista em formação. O conhecimento de profissionais experientes vale ouro e tem custos elevados, porém úteis durante toda uma carreira. Esteja preparado para receber muitos “não” – ou nem resposta receber. Pode demorar para boas oportunidades surgirem, mas, construir algo sólido, ético e profissional é a garantia de que as oportunidades que surgirem sejam devidamente aproveitadas.


Por Alberto Santos - 13 out. 2017


https://www.comportese.com/2017/10/existem-caminhos-para-entrar-no-mercado-da-psicologia-do-esporte-entendendo-o-ambiente-esportivo-parte-ii

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